Capoeira e a Integração de Imigrantes através da língua e da cultura popular
Fã de capoeira, estudante japonesa se destaca em concurso de oratória em português
Ruri Kawamura defendeu a integração de imigrantes brasileiros no Japão a partir de suas raízes culturais. Ela foi uma das três melhores estrangeiras em competição organizada pelo consulado brasileiro em Nagoia.
A universitária japonesa Ruri Kawamura ficou no top 3 da competição cultural organizada pelo Consulado-Geral do Brasil em Nagoia, discursando sobre a integração de imigrantes brasileiros no Japão.
“A capoeira me ensinou a gingar na vida”, diz a estudante de 22 anos com um sotaque singular e um sorriso de orelha a orelha.
Ruri Kawamura
“É um modo de aprender várias lições de vida. Em particular, pode ser uma ótima oportunidade para as crianças brasileiras [radicadas no Japão] entrarem em contato com a língua portuguesa e conhecer um pedaço da história do Brasil”, diz a jovem universitária, que cursa Letras na Universidade de Aichi.
Foi com um discurso apaixonado pela capoeira que Ruri se destacou no concurso de oratória organizado pelo Consulado-Geral do Brasil em Nagoia, cujo resultado foi divulgado em dezembro. Ruri ficou no top 3 na categoria “não-brasileiros” da competição cultural, que teve mais de 40 inscritos.
Ruri é natural da cidade de Toyokawa, no sul de Aichi, província que concentra mais de 60 mil brasileiros, segundo dados do Ministério da Justiça do Japão.
Na infância, ela teve amigos brasileiros, filhos de imigrantes “dekasseguis”, como são chamados os trabalhadores temporários que vêm migrando do Brasil ao Japão desde a década de 1990. Foi com eles que Ruri conheceu símbolos da cultura brasileira, como a capoeira.
A jovem também domina o espanhol e o inglês. Nos últimos dois anos, ela decidiu estudar português para aproveitar melhor as rodas de capoeira angola que integra no campus.
“A capoeira é uma arte”, diz ela. Ruri lembra que a capoeira, antes marginalizada, é atualmente considerada Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade. Também é um esporte e uma expressão da cultura popular brasileira que mistura arte marcial, música e dança.
A capoeira floresceu no Brasil por iniciativa de descendentes de africanos escravizados na época colonial. Graças a ela, muitos deles conseguiram fugir para os quilombos, locais de resistência.
Nos últimos dez anos, a capoeira passou a despertar interesse de jovens japoneses. Ruri diz que gostaria de inspirar a prática entre jovens e crianças brasileiras radicadas no Japão. Especialmente entre filhos de brasileiros que nasceram e cresceram no Japão. Muitos deles nunca visitaram o Brasil, não tiveram ou não têm muito contato com a cultura brasileira e nem com a língua portuguesa.
Neste mês, Ruri pretende iniciar um projeto sociocultural junto a organizações não-governamentais atuantes na província de Aichi, para levar oficinas de capoeira para crianças nos “danchis”, conjuntos habitacionais onde vivem muitos imigrantes.
“A capoeira me ensinou a importância da continuidade, de continuar, seguir, treinar todos os dias. Resistir”, diz a jovem.
Língua de herança
A energia da estudante atraiu atenções no consulado. Para a vice-cônsul Elisa Maia, a responsável pela organização de concursos culturais, o discurso de Ruri se destacou por inspirar esse olhar à capoeira como “oportunidade de integração entre as pessoas, independentemente do idioma e da nacionalidade”. “Dá muita alegria ouvir as palavras dela”, diz Elisa.
Atualmente, há cerca de 210 mil brasileiros vivendo no arquipélago, segundo dados do Consulado-Geral do Brasil em Tóquio. Unidades consulares vêm promovendo ações para divulgar a cultura brasileira e a língua portuguesa tanto para jovens japoneses quanto para jovens brasileiros nascidos no Brasil ou no Japão.
A imigração brasileira ao Japão se iniciou em 1990. Por isso, na edição de 2020 do concurso de oratória, digital por conta da pandemia de Covid-19, a proposta para os discursos dos candidatos foi “30 anos depois: meu sonho para o futuro da comunidade brasileira no Japão”.
A ideia, diz a vice-cônsul, é difundir a língua portuguesa como um modo de preservar um elo cultural no contexto da imigração e da identidade dos imigrantes.
Para muitos dos filhos de brasileiros nascidos no Japão, o português é uma “língua de herança”. Isto é, eles foram alfabetizados na língua japonesa e, muitas vezes, só têm contato com a língua portuguesa dentro de casa, no contexto da família. “É a língua herdada dos pais”, define Elisa.
Além de jovens japoneses como Ruri, instituições japonesas estão interessadas na língua portuguesa. Nos últimos tempos, por exemplo, bibliotecas buscaram unidades consulares para pedir livros em português devido à alta demanda de certas cidades, onde há muitos residentes estrangeiros.
O concurso de oratória também inspirou as Olimpíadas de Português como Língua de Herança, organizadas junto ao Ministério das Relações Exteriores do Brasil, o Itamaraty. Um dos objetivos, segundo o edital, é contribuir para a valorização da língua portuguesa no Japão. As regras estão disponíveis no site oficial do consulado e as inscrições estão abertas até 30 de abril.
Fonte: https://g1.globo.com/educacao/
Por Juliana Sayuri, RFI
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